quinta-feira, 2 de setembro de 2021

A EDUCAÇÃO QUE MUDA VIDAS

Natália Apolinário saiu do ensino público estadual para destacar-se em multinacional e encantar plateias no teatro. Ela é a prova de que a educação transforma vidas e forma caráter.

Natália Apolinário Aparecida dos Santos, 29 anos, hoje assistente de engenharia em uma multinacional, tinha o sonho de ser uma atriz independente, solteira, sem filhos e viver de arte, porém a vida preparou outros planos para ela.

Estudante de escola pública, morando na comunidade do Morro do Batista em Resende, interior do estado do Rio de Janeiro, Natália teve tudo para desistir e ser mais um número na estatística de evasão escolar ou ainda pior, mas a educação traçou um rumo diferente para a jovem. Natália é a caçula da família com dois irmãos, sua mãe é diarista e seu pai aposentado, mas sempre prezaram pela boa educação. Uma família comum, com um destino comum, se não fosse a força e a garra da menina que estudou no Colégio Estadual Marechal Souza Dantas, no Centro da cidade, da 5ª série do ensino fundamental até completar o ensino médio em 2009.

Da escola Natália lembra com carinho de todos, mas em especial da professora de português, carinhosamente conhecida como Dona Ângela, que inclusive chegou a ser diretora da escola por vários anos. “Ela foi muito importante na minha vida e sou grata a ela pela facilidade em me comunicar e de forma correta. Sempre me lembro dela quando vejo um erro de português, é uma coisa que me incomoda muito e agradeço a ela. Quando fiz a entrevista e o teste de habilidade para entrar na multinacional me classifiquei em oitavo lugar entre 500 inscritos e sei que a Dona Ângela tem uma grande parcela nisso.” – disse, revelando a gratidão pelo incentivo da professora.

Outra lembrança boa da época de escola foi um prêmio que Natália recebeu quando no último ano do ensino médio participou da olimpíada de português. Ela ganhou um notebook do Governo do Estado após estar entre os 500 melhores alunos de todo o estado do Rio de Janeiro. “Me ajudou muito nos estudos porque foi meu primeiro notebook. Na minha casa nem tínhamos computador.” – revela.

            Natália Apolinário conta que sempre lutou para fazer a diferença e não se conformava em ser apenas mais uma em meio à multidão, afinal, morando em comunidade não seria difícil ter outras opções que tiraria dela o foco nos estudos. “Minha formação foi com pessoas comuns com dificuldades comuns. Nada foi fácil pra mim. Aprendi sempre uma maneira diferente de fazer as coisas e isso me fez contornar desafios. Não me contentava com "sempre foi assim". Meus professores me ensinaram a ultrapassar paradigmas e a sempre pensar em “como é possível fazer?” e assim fui vencendo os obstáculos”.

 

            Natália foi contratada em junho de 2015, como operador sênior, pra fazer o startup da empresa que ainda estava sendo construída em Itatiaia, cidade vizinha a Resende. “Trabalhei 15 dias aqui em Itatiaia, pra aprender os procedimentos e aí em agosto fui pra Liverpool pra trabalhar na fábrica de Halewood, no Reino Unido (que fabricavam os mesmos carros que nós). Trabalhei na produção de lá pra aprender determinadas operações e retornei em setembro. Fiquei até novembro trabalhando nas traduções das folhas de instrução de montagem quando os primeiros operadores foram contratados e então realizamos os treinamentos deles, pois a equipe que foi pra Inglaterra quando retornou foi promovida a product coach (treinador de produto). Éramos 9 pessoas que faziam parte do launch (área de lançamento) e dessa equipe fui a única mulher na Inglaterra”.

            Natália foi uma das primeiras pessoas contratadas da multinacional no Brasil e tem muito a comemorar desde que iniciou no trabalho em 2015. Em junho de 2016 foi feito o primeiro carro vendável na empresa do Brasil. Natália ficou na área de lançamento até agosto 2018 quando engravidou e saiu de licença-maternidade. Ao retornar em fevereiro de 2019 foi para a engenharia, trabalhando no sistema integrado de produção, também conhecido como IPS (Integrated Production System), que é a área responsável por fazer auditorias de processo na fábrica, ficando nessa área até dezembro do ano passado.

            Hoje Natália trabalha na engenharia industrial e chegou a receber o Prêmio de Destaque do Time de Engenharia em junho deste ano. O setor é responsável pelo planejamento da produção referente à análise de tempo, que compõe a operação de montagem e logística em toda a planta da multinacional. Com toda essa responsabilidade Natália reconhece a importância dos estudos nesse processo: “Eu, provavelmente não teria me destacado e estaria trabalhando numa multinacional, chegando a ir para outro país a trabalho se não fossem meus professores”.

 

A vida no palco:

            Mãe do Arthur, de dois anos e dez meses, Natália sempre sonhou em ser atriz e viver da arte. Um sonho que foi realizado parcialmente e contou mais uma vez com o Colégio Estadual Marechal Souza Dantas como intermediador desse sonho.

            Em 2017 a prefeitura da cidade realizou o Festudantil (Festival Estudantil de Artes), na época houve uma seleção no colégio e Natália foi escolhida para integrar o grupo de teatro que representaria a unidade escolar no Festival. O sucesso foi tanto que Natália ganhou o prêmio de Melhor Atriz do Festival, interpretando Chapeuzinho Vermelho em uma versão contemporânea baseada no filme “Companhia dos Lobos”. Na época o destaque rendeu a Natália o convite para participar da Companhia LIATT de Teatro e Improviso e com o convite a jovem realizou seu sonho de ser atriz, chegando a se apresentar no Campeonato Carioca de Improviso em Botafogo, na capital, no Fringe (mostra paralela do Festival de Curitiba-PR) e tantos outros lugares com a LIATT, sempre destacando-se por seu talento como atriz. Como o grupo não é a renda principal de nenhum dos integrantes, as apresentações ocorrem aos finais de semana e os ensaios durante as noites no meio de semana, mas Natália confessa que já está com saudades dos palcos, pois desde o começo da pandemia os ensaios pararam. “Ano passado estávamos com tudo certo para pisar nos palcos curitibanos quando chegou a pandemia. Achamos que passaria logo, então paramos os ensaios e aguardamos o fim da vacinação para retornar.” – revela.

            Na Companhia LIATT, Natália, além de atriz é assistente de direção e escritora. Essa última, uma paixão pra ela que é uma leitora voraz e uma escritora em formação, como costuma dizer.