Natália
Apolinário Aparecida dos Santos, 29 anos, hoje assistente de engenharia em uma
multinacional, tinha o sonho de ser uma atriz independente, solteira, sem
filhos e viver de arte, porém a vida preparou outros
planos para ela.
Estudante
de escola pública, morando na comunidade do Morro do Batista em Resende,
interior do estado do Rio de Janeiro, Natália teve tudo
para desistir e ser mais um número na estatística de evasão escolar ou ainda
pior, mas a educação traçou um rumo diferente para a jovem. Natália é a caçula
da família com dois irmãos, sua mãe é diarista e seu pai aposentado, mas sempre
prezaram pela boa educação. Uma família comum, com um destino comum, se não
fosse a força e a garra da menina que estudou no Colégio Estadual Marechal
Souza Dantas, no Centro da cidade, da 5ª série do ensino fundamental até completar
o ensino médio em 2009.
Da escola
Natália lembra com carinho de todos, mas em especial da professora de português,
carinhosamente conhecida como Dona Ângela, que inclusive chegou a ser diretora
da escola por vários anos. “Ela foi muito
importante na minha vida e sou grata a ela pela facilidade em me comunicar e de
forma correta. Sempre me lembro dela quando vejo um erro de português, é uma
coisa que me incomoda muito e agradeço a ela. Quando fiz a entrevista e o teste
de habilidade para entrar na multinacional me classifiquei em oitavo lugar
entre 500 inscritos e sei que a Dona Ângela tem uma grande parcela nisso.”
– disse, revelando a gratidão pelo incentivo da professora.
Outra
lembrança boa da época de escola foi um prêmio que Natália recebeu quando no
último ano do ensino médio participou da olimpíada de português. Ela ganhou um
notebook do Governo do Estado após estar entre os 500 melhores alunos de todo o
estado do Rio de Janeiro. “Me ajudou
muito nos estudos porque foi meu primeiro notebook. Na minha casa nem tínhamos
computador.” – revela.
Natália Apolinário conta que sempre lutou para fazer a diferença e não se conformava em ser apenas mais uma em meio à multidão, afinal, morando em comunidade não seria difícil ter outras opções que tiraria dela o foco nos estudos. “Minha formação foi com pessoas comuns com dificuldades comuns. Nada foi fácil pra mim. Aprendi sempre uma maneira diferente de fazer as coisas e isso me fez contornar desafios. Não me contentava com "sempre foi assim". Meus professores me ensinaram a ultrapassar paradigmas e a sempre pensar em “como é possível fazer?” e assim fui vencendo os obstáculos”.
Natália
foi contratada em junho de 2015, como operador sênior, pra fazer o startup da
empresa que ainda estava sendo construída em Itatiaia, cidade vizinha a
Resende. “Trabalhei 15 dias aqui em
Itatiaia, pra aprender os procedimentos e aí em agosto fui pra Liverpool pra
trabalhar na fábrica de Halewood, no Reino Unido (que fabricavam os mesmos
carros que nós). Trabalhei na produção de lá pra aprender determinadas
operações e retornei em setembro. Fiquei até novembro trabalhando nas traduções
das folhas de instrução de montagem quando os primeiros operadores foram
contratados e então realizamos os treinamentos deles, pois a equipe que foi pra
Inglaterra quando retornou foi promovida a product
coach (treinador de produto). Éramos 9 pessoas que faziam parte do launch (área de lançamento) e dessa
equipe fui a única mulher na Inglaterra”.
Natália foi uma das primeiras pessoas contratadas da multinacional no Brasil e tem muito a comemorar desde que iniciou no trabalho em 2015. Em junho de 2016 foi feito o primeiro carro vendável na empresa do Brasil. Natália ficou na área de lançamento até agosto 2018 quando engravidou e saiu de licença-maternidade. Ao retornar em fevereiro de 2019 foi para a engenharia, trabalhando no sistema integrado de produção, também conhecido como IPS (Integrated Production System), que é a área responsável por fazer auditorias de processo na fábrica, ficando nessa área até dezembro do ano passado.
Hoje
Natália trabalha na engenharia industrial e chegou a receber o Prêmio de
Destaque do Time de Engenharia em junho deste ano. O setor é responsável pelo
planejamento da produção referente à análise de tempo, que compõe a operação de
montagem e logística em toda a planta da multinacional. Com toda essa
responsabilidade Natália reconhece a importância dos estudos nesse processo: “Eu, provavelmente não teria me destacado e estaria
trabalhando numa multinacional, chegando a ir para outro país a trabalho se não
fossem meus professores”.
A vida no palco:
Mãe
do Arthur, de dois anos e dez meses, Natália sempre sonhou em ser atriz e viver
da arte. Um sonho que foi realizado parcialmente e contou mais uma vez com o
Colégio Estadual Marechal Souza Dantas como intermediador desse sonho.
Em
2017 a prefeitura da cidade realizou o Festudantil (Festival Estudantil de
Artes), na época houve uma seleção no colégio e Natália foi escolhida para
integrar o grupo de teatro que representaria a unidade escolar no Festival. O
sucesso foi tanto que Natália ganhou o prêmio de Melhor Atriz do Festival,
interpretando Chapeuzinho Vermelho em uma versão contemporânea baseada no filme
“Companhia dos Lobos”. Na época o destaque rendeu a Natália o convite para
participar da Companhia LIATT de Teatro e Improviso e com o convite a jovem
realizou seu sonho de ser atriz, chegando a se apresentar no Campeonato Carioca
de Improviso em Botafogo, na capital, no Fringe (mostra paralela do Festival de
Curitiba-PR) e tantos outros lugares com a LIATT, sempre destacando-se por seu
talento como atriz. Como o grupo não é a renda principal de nenhum dos integrantes,
as apresentações ocorrem aos finais de semana e os ensaios durante as noites no
meio de semana, mas Natália confessa que já está com saudades dos palcos, pois
desde o começo da pandemia os ensaios pararam. “Ano passado estávamos com tudo certo para pisar nos palcos curitibanos
quando chegou a pandemia. Achamos que passaria logo, então paramos os ensaios e
aguardamos o fim da vacinação para retornar.” – revela.
Na
Companhia LIATT, Natália, além de atriz é assistente de direção e escritora.
Essa última, uma paixão pra ela que é uma leitora voraz e uma escritora em
formação, como costuma dizer.